Sep 18 / José Mariz

Dor Pleurítica Aguda: Um Caso Pós-Cirúrgico

Descubra como o Triple POCUS (avaliação POCUS Cardíaca, Pulmonar e do Membro Inferior) se revela decisivo no diagnóstico e na orientação do doente neste contexto clínico, quando apropriadamente usado como 5º pilar do exame físico.
Este caso clínico é apresentado com o recurso à estrutura dos 4 Is do POCUS: Identificação, Imagem, Interpretação e Integração.

Identificação

Doente do sexo feminino, de 47 anos de idade, recorre ao Serviço de Urgência (SU) por dor de características pleuríticas no hemitórax esquerdo com 24 horas de evolução. Sem outros sintomas na admissão na triagem.

Trata-se de doente medicada com contraceptivo oral e que foi submetida a artroscopia do joelho esquerdo para cirurgia a Quisto de Baker 15 dias antes da admissão. Ficou com indicação para repouso. Não ficou hipocoagulada.

Refere que esteve bem no pós-operatório até o dia anterior à admissão, altura em que sentiu uma dor tipo pontada no hemitórax esquerdo de início súbito, tendo evoluído para dor “tipo ferrada” que agrava com a inspiração profunda, ao qual se associou dispneia ligeira. Não associa qualquer tipo de esforço ou circunstância particular na instalação da dor.

Exame Objectivo na admissão no SU

  • Bom estado geral, sem sinais de dificuldade respiratória.
  • TA 121/56 mmHG, FC 95 bpm, SatO2 99% em ar ambiente.
  • Apirética.
  • AP: Murmúrio vesicular presente bilateralmente, sem ruídos adventícios.
  • AC: S1+S2, regular, sem sopros audíveis.
  • Abdómen sem defesa involuntária.
  • No final do exame a doente referiu que nas últimas horas tem sentido uma dor na perna direita, a qual se tem agravado. Avaliada a perna objectivamente, sem evidência de edema ou sinais inflamatórios, com questionável sinal de Homans positivo.
  • ECG revelou taquicárdia sinusal, sem outras alterações.
  • GSA em aa com alcalose respiratória ligeira.
  • Escala de Wells: 7.5 pontos.

Imagem

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Interpretação

Qual é o diagnóstico e quais as orientações que tomaria?

O diagnóstico é Trombose Venosa Profunda (TVP) da veia poplitea direita com Tromboembolismo Pulmonar (TEP). A orientação será iniciar imediatamente hipocoagulação com Heparina de Baixo Peso Molecular em dose terapêutica. Deverá realizar Tomografia Axial Computorizada (TAC) pulmonar com contraste (AngioTAC pulmonar), de modo a confirmar a presença de TEP.

Este caso sublinha a importância da POCUS como o 5º pilar do exame físico, apontando, de igual modo, para o potencial do Triple POCUS (avaliação POCUS Cardíaca, Pulmonar e do Membro Inferior) na avaliação de doentes com suspeita de TEP.

Esse potencial tanto é maior quando exista impossibilidade de realizar a AngioTAC pulmonar, quer se trate de ausência do aparelho ou presença de contraindicações médicas (grávidas, doença renal, alergia ao contraste, são uns exemplos).

A possibilidade de realizar o diagnóstico de TVP e/ou TEP à cabeceira do doente permite assim a orientação do doente de forma imediata. Neste caso em particular, a doente iniciou Enoxaparina em dose terapêutica imediatamente após a realização de POCUS.

Foi discutida a necessidade de internamento com a equipa de Medicina Interna da enfermaria, tendo sido decidido internar a doente para realizar estudo adicional de causas pró-trombóticas e consolidação da anticoagulação oral.

Foi também planeada a realização de AngioTAC pulmonar, que não foi feita imediatamente para dar prioridade ao uso do aparelho para outros exames naquele momento no SU.

Integração

Neste caso, pudemos observar a evidência de TVP na veia poplítea direita, pelo método de compressão. Quando o exame físico não oferece mais do que uma forte suspeita, POCUS do membro inferior permitiu confirmá-la.

A avaliação da dor torácica no Serviço de Urgência (SU) é orientada inicialmente para as causas que podem colocar em risco a vida. Na embolia pulmonar, a oclusão da circulação arterial pulmonar pode levar a hipertensão pulmonar, disfunção e/ou insuficiência cardíaca direita, más trocas gasosas, e ultimamente a enfarte pulmonar.

A avaliação cardíaca neste caso permitiu excluir a disfunção cardíaca, bem como outras causas cardíacas graves para dor torácica. No entanto, a adição da ecografia pulmonar permitiu identificar uma área anecoica, de forma triangular, de localização subpleural, na região topográfica da queixa álgica da doente. Avaliada esta alteração no quadro clínico, pode levar-se a concluir que se trata de uma área de enfarte.

Este quadro foi depois confirmado, mais de 12 horas depois da admissão no SU, formalmente com a realização da AngioTAC pulmonar (que confirmou a presença de TEP e a área de enfarte).

No entanto, deve ser realçado que a POCUS é menos sensível e específica do que a AngioTAC pulmonar, pelo que esta deve ser usada na suspeita de TEP quando estiver disponível e não existirem contraindicações.

Mas quando apropriadamente usado como 5º pilar do exame físico, POCUS aumenta a eficiência da orientação do doente. Perante a dor torácica neste caso, a confirmação da TVP e a avaliação cardíaca e pulmonar permitiram o tratamento imediato e a orientação subsequente da doente, permitindo um uso racional dos meios.
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Para uma melhor compreensão dos pilares “Identificação, Imagem, Interpretação e Integração”, que estruturam a análise sistemática dos casos clínicos, em “Modelo dos 4 Is do POCUS” apresento esta abordagem. Estes princípios não só oferecem soluções adaptadas a cada cenário, mas também facilitam a comunicação entre diferentes especialidades.

Referências:

Narula J, Chandrashekhar Y, Braunwald E. Time to Add a Fifth Pillar to Bedside Physical Examination: Inspection, Palpation, Percussion, Auscultation, and Insonation. JAMA Cardiol. 2018 Apr 1;3(4):346-350. doi: 10.1001/jamacardio.2018.0001. PMID: 29490335.

Nazerian P, Vanni S, Volpicelli G, Gigli C, Zanobetti M, Bartolucci M, Ciavattone A, Lamorte A, Veltri A, Fabbri A, Grifoni S. Accuracy of point-of-care multiorgan ultrasonography for the diagnosis of pulmonary embolism. Chest. 2014 May;145(5):950-957. doi: 10.1378/chest.13-1087. PMID: 24092475.
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